Concorrência desleal
A decisão da Justiça no caso Puma x Kezo reforça que copiar elementos de marcas renomadas é concorrência desleal e gera indenização.
Imagine ver o famoso logo da Puma estampado em outro produto, sem qualquer ligação com a marca de roupas esportivas. Foi exatamente isso que aconteceu quando a Kezo decidiu usar, de forma isolada, a silhueta do animal, que é parte central da identidade visual da Puma.
A Puma levou o caso aos tribunais e ganhou. A Justiça determinou que a Kezo parasse de usar o logo e ainda pagasse R$ 20 mil de indenização por danos morais. O desembargador Sérgio Seiji Shimura deixou claro: marcas de alto renome merecem proteção extra e usar seus elementos essenciais, mesmo separados, configura concorrência desleal.
A concorrência desleal é mais comum do que imaginamos e pode surgir em qualquer segmento do mercado. O caso Puma evidencia três lições fundamentais: a proteção conferida às marcas de alto renome se estende a todos os setores, independentemente do nicho em que atuem; a confusão que prejudica o consumidor pode ser visual, sonora ou até conceitual; e, quando esse risco existe, a Justiça presume a ocorrência de danos morais, dispensando a prova de prejuízo concreto.
É extremamente importante ter cuidado com esse tipo de conduta, pois ela traz implicações legais para quem a pratica, gerando penalidades que podem custar caro.
A concorrência desleal acontece quando alguém tenta cortar caminho usando meios desonestos para roubar clientela, reputação ou segredos de outro negócio. O ponto de partida da economia brasileira está na Constituição, que garante a livre iniciativa e a livre concorrência, mas condiciona ambas à justiça social. Significa que competir é bem-vindo, contanto que se jogue limpo.
Por trás da proteção contra a concorrência desleal existe um tripé de normas. A lei de propriedade industrial descreve, em detalhes, o que não se pode fazer (como atrair clientela copiando sinais de outra marca) e prevê punições que vão de multa a detenção, além de indenização em dobro ao prejudicado. Já o CDC impõe ao Poder Público o dever de coibir abusos e declara ilícita qualquer publicidade que distorça a percepção do comprador ou compare produtos de modo desleal. Completa o quadro o conjunto de regras sobre direitos autorais e marca, que trata a falsificação de obras, patentes ou logotipos como crime.
Em conjunto, essas normas formam um cerco que desencoraja a tentativa de confundir o público ou se aproveitar da reputação construída por terceiros. Todos esses comportamentos abrem caminho para liminares que suspendem a conduta, multas diárias e indenizações. Nos casos mais graves, há inclusive responsabilização criminal.
Abaixo, listamos os exemplos mais corriqueiros sobre a concorrência desleal:
- Publicidade enganosa e abusiva: Quando a propaganda afirma, sem qualquer prova, que o produto é “o melhor do mercado”. Além de lesar o concorrente, engana o consumidor e viola o art. 37 do CDC e o art. 195, I, LPI.
- Imitação de produtos e marcas: Copiar design, cores ou logotipo para aproveitar da fama alheia. Se o consumidor confunde a origem, há concorrência desleal e violação de marca (art. 195, III, LPI).
- Venda de produtos falsificados ou piratas: Relógios de luxo, roupas ou eletrônicos vendidos como originais, mas sem licença. Falsificação é crime (arts. 184 e 190, LPI) e gera busca, apreensão e indenização.
- Difamação da concorrência: Espalhar boatos do rival, sem prova documental. Configura difamação comercial e prática abusiva (art. 195, I, LPI).
- Quebra de confidencialidade: Ex-funcionário leva lista de clientes ou projeto inédito e lança empresa própria. É uso indevido de segredo de negócio e desvio de clientela (art. 195, XI, LPI).
Como perceber que você está sendo alvo de concorrência desleal?
- Queda repentina nas vendas digitais sem mudança de preço ou campanha do concorrente: pode indicar anúncios enganosos capturando seu tráfego.
- Consumidores perguntando se duas marcas são a mesma: sinal forte de imitação de logotipo ou embalagem.
- Avaliações negativas idênticas postadas em sequência: indício de ataque coordenado para descredibilizar seu produto.
- Ofertas muito abaixo do preço de mercado: suspeita de pirataria ou desvio de estoque.
- Ex-colaborador lança produto idêntico logo após sair: verifique se ele não levou dados confidenciais acessados durante o contrato.
Detectar cedo faz toda a diferença, porque decisões liminares, quando bem demonstrada a urgência, podem retirar produtos ou anúncios em questão de horas.
A melhor estratégia para prevenir e reagir a concorrência desleal combina políticas internas, cláusulas contratuais, ferramentas tecnológicas e governança de crises.
A qualidade do contrato ainda é o primeiro escudo. Acordos de confidencialidade devem listar claramente as informações protegidas e manter a obrigação por no mínimo cinco anos após o término. Cláusulas de não captação de clientela com multas escalonadas desestimulam o colaborador ou parceiro a abordar sua base. Pactos de não concorrência, quando proporcionais em duração e território, são válidos e eficientes para proteger know-how sensível.
Rastrear o uso indevido da marca em redes sociais, marketplaces e motores de busca já é tarefa que pode ser automatizada. Existem plataformas que enviam alertas em tempo real quando um logotipo é detectado fora dos canais oficiais. Algoritmos de visão computacional reconhecem padrões de embalagem falsificada e abastecem relatórios de evidência.
Programas de compliance concorrencial expõem regras claras, treinam equipes de marketing e vendas, e oferecem canal de denúncia anônima. A política deve prever resposta em até 48 horas após o alerta: TI recolhe provas, jurídico avalia as medidas, e comunicação prepara nota para stakeholders, evitando que a narrativa seja dominada pelo infrator.
Uma notificação extrajudicial, bem calibrada e acompanhada de provas, resolve muitos casos sem precisar de ação. Se o infrator persiste, o caminho é a ação com pedido de liminar: a tutela provisória pode impedir vendas, colher provas periciais e bloquear valores.
Concorrência desleal não é uma simples infração, ela destrói o elo de confiança que sustenta toda a cadeia de valor entre o fornecedor e o consumidor final. Cada vez que alguém vende um produto pirateado, imita um design consagrado ou espalha boatos sobre o concorrente, destrói-se a credibilidade do mercado como um todo e adia-se o retorno sobre o investimento de quem cria, pesquisa e inova.
A prevenção custa menos em todos os fatores (tempo, energia e dinheiro) do que o litígio. Empreendimentos que incorporam procedimentos de proteção (contratos claros, monitoramento tecnológico e cultura interna de integridade) reduzem drasticamente o espaço para desvios. Revisar acordos de confidencialidade, registrar marcas em todos os países-alvo e adotar ferramentas de vigilância digital são medidas objetivas que preservam ativos intangíveis antes que o problema vire manchete.
https://www.migalhas.com.br/depeso/443125/concorrencia-desleal





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